Moda como extensão do corpo: O Espírito das Roupas
- Larissa Souza
- 16 de ago. de 2020
- 14 min de leitura
Atualizado: 17 de ago. de 2020
Gilles Lipovetsky em o Império do Efêmero aborda a moda sob a ótica histórica a fim de analisar suas constituições e transformações através do processo histórico e comportamento humano. A moda no formato que temos hoje é fruto do capitalismo desde suas origens ainda no mercantilismo, fenômeno Ocidental que avança ao mundo juntamente com os movimentos colonialista.
Moda Aristocrática
É com o advento da Burguesia como mimetismo da Aristocracia, e nos primórdios do Capitalismo mercantil, com a ascensão ainda vagarosa dos recursos têxteis na Europa. O campo já não era mais a atividade econômica mais valiosa e os comerciantes já começavam a se estabelecer socialmente. A aristocracia entretanto não abria mão de suas frivolidades e riquezas, exacerbados em formas, cores e adornos, e a alta burguesia que almeja o status da aristocracia passa a copiar as maneiras e gostos do luxo da nobreza. Como resposta imediata em repúdio a nova classe social que ascendia a aristocracia transformava as vestimentas, beleza a fim de desvencilhar sua imagem dos burgueses. Assim a moda pôde se estabelecer.
O luxo aqui é um recorte de classe e não de gênero, inclusive diversas leis e protocolos eram extremamente estritos e necessários aos homens para garantir elegância e exibir sua fortuna. Promovidos principalmente pela figura de Luís XIV.
Essa dinâmica percorre do século XIV ao XVIII sob figura máxima de Maria Antonieta, às vésperas da Revolução Francesa em que as pautas sociais se sobrepõe as rivalidades de classe e a moda deixa de ser frivolidade e passa a marcar a expressão individual. E como marco a guilhotina torna-se símbolo na moda aristocrática
Moda dos Cem Anos
A moda dos Cem anos, posterior à figura de Maria Antonieta perdura do século XVIII até meados dos anos 1950 se inicia sob a pauta da Revolução Francesa: Igualdade, Liberdade e Fraternidade, inclusive no ato de vestir.
Articulada na dinâmica da Alta Costura e da Confecção Industrial a moda dos Cem Anos passa a se desenvolver neste sistema bipolar do luxo sob medida e da produção de massa em série e barata.
O fato é que esse funcionamento escancara o funcionamento do Capitalismo e como ele se estabelece na sociedade e principalmente como aumenta cada vez mais as diferenças sociais ao longo do processo histórico. Com o tempo as mulheres recorriam às costureiras para reproduzir os vestidos apresentados pela Alta Costura, a partir dos seus “moldes” difundidos pelas magazines. Nos Estados Unidos, principalmente, essa reprodução começa a ser feita em larga escala, rapidamente e baixo custo. Assim, a Alta Costura monopoliza a inovação ao passo que a indústria segue se inspiram nela a fim de manter seu funcionamento. Esse movimento ocorre principalmente no vestuário feminino, visto que o masculino ainda não possuía interesse e movimento na Indústria. Mesmo que um movimento importante para a moda masculina surgisse entre personalidades na Europa. Sob o título de Dândis, personalidades como Beau Brummell e Oscar Wilde em um movimento “anti-moda”, diante dos parâmetros da moda masculina da época, ostentavam tecidos caros, formas e silhuetas incomuns e indiscretas, conhecidos como “engomados” rejeitavam a apresentação sempre sóbria e ordinária.
Mas é com Charles Frédéric Worth que em 1958 anuncia seu ateliê “Vestidos e mantôs confeccionados, sedas, altas novidades” este é o início das maisons francesas, que faz um grande sucesso, abrindo oportunidades para novas casas de Alta Costura como Lanvin, Chanel e Patou. A presença de mais nomes na Alta Costura inicia os ciclos regulares das coleções sazonais. E por mais contraditório que pareça a indústria do luxo contribuiu igualmente para a democratização da moda, quando nos anos 1920, com a simplificação do vestuário feminino, encurtamento dos comprimentos e silhuetas mais retas, também por efeitos da guerra e da escassez de recursos e principalmente da ascensão do processo democrático.
A heterogeneidade das toaletes, consubstancial à ordem aristocrática, onde o fausto ostentatório é um imperativo social destinado a marcar com brilho a dessemelhança humana e social, foi substituída, no começo do século XX, por uma moda de tendência “homogênea”, que repousa na própria rejeição do princípio da exibição majestosa e superior da hierarquia. “Outrora as mulheres eram arquitetônicas como proas de navios, e belas. Agora, parecem pequenas telegrafistas subalimentadas”, dizia Poiret — a alteridade social, longe de ser supersignificada pelo traje, é no presente oculta em razão da decadência dos signos da suntuosidade ostensiva. Reabsorção dos símbolos da distância social que, evidentemente, não pode ser separada do imaginário democrático da igualdade de condições: seres reconhecidos de essência semelhante não podem, no limite, senão oferecer uma imagem de si mesmos sem disparidade extrema, sem marca gritante de fosso hierárquico. No mais profundo da revolução do vestuário feminino do século XX, na sequência da dos homens, há o desmoronamento do universo “holista”, o advento de uma sociedade comandada pelo ideal da igualdade democrática. (Lipovetsky, 1987)
De certo ponto de vista a Alta Costura mais uniformizou do que individualizou, visto que as criações que reverberam nas Champs-Elysées alimentavam o desejo nas grandes metrópoles. Porém a diversidade de nichos possibilitou a criação da coabitação de imagens díspares, por vezes antagônicas da mesma personagem, isto é a mesma mulher possuir diversos estilos:
De um lado a moda de dia, discreta, confortável e funcional, de outro a noturna que realçava a sedução do corpo feminino. A democratização da moda colabora para uma desunificação da aparência feminina, tornando-se menos homogênea. Isso se deve a diversos fatores culturais e estéticos, desde o avanço da ocupação das mulheres nos espaços do esporte, como a prática do golfe, do tênis, da bicicleta, dos banhos de mar, dos esportes de inverno, que permitiu aquela que, antes era uma mudança lenta e gradual, torna-se acelerada, principalmente após a Primeira Guerra, aos trajes femininos.
A arte moderna influência desde o princípio o fazer da moda, desde a sua consideração como arte com estilistas como Poiret ou Balenciaga, chamado de o Picasso da moda, até a intersecção entre as áreas como os vestidos Mondrian, Pop Art ou as saias de Picassos de Yves Saint-Laurent. Ou até mesmo as coleções de Elsa Schiaparelli com Salvador Dalí que ajudavam a difundir o conceito do Surrealismo mais afundo através das roupas e adornos da estilista.
A consagração dos criadores de moda, evidentemente, só se explica parcialmente a partir da ambição corporativista, mesmo exacerbada pela exigência igualitária. Se a gente de moda conseguiu ser reconhecida como artistas de gênio é que uma nova sensibilidade para as superfluidades, novas aspirações apareceram, valorizando de maneira inédita feitos até então indignos de ser levados em conta. Sem dúvida, desde a Renascença a moda gozava de certa consideração como símbolo de excelência social e de vida de corte. Contudo, não a ponto de merecer ser exaltada e descrita em sua realidade detalhada. (Lipovetsky, 1987)
A Alta Costura psicologizou a moda, concretizando através dos modelos emoções, traços de personalidade e de caráter. Desde então a mulher pode parecer melancólica, sofisticada, severa, ingênua ou jovem apenas pelo que escolhe vestir. Esse processo cria o prazer narcísico de se metamorfosear, “mudar a pele” tornar-se e sentir-se outra. Esse processo é incentivada pelas coleções sazonais, de fazer questionar: “que mulher quero ser esta primavera?”
E com o avanço das novas mídias, do Cinema e de figuras internacionais, novos gostos comuns pairam pelo senso comum e cada vez mais o mesmo tipo de peças são desejadas pelo público, um padrão passa a se repetir e ser produzido em maior quantidade.
O que se chama de “tendência” da moda, em outras palavras, a similitude existente entre os modelos das diferentes coleções de um mesmo ano (lugar da cintura, comprimento do vestido, profundidade do decote, largura dos ombros) e que muitas vezes faz crer, erroneamente, que a moda é decretada por combinação deliberada entre os costureiros, não faz senão confirmar a lógica “aberta” do poder da Alta Costura. (...). A ideia inédita de um costureiro, muitas vezes tímida e pouco explorada no início, é então muito rapidamente reconhecida como tal, captada, transposta, desenvolvida pelos outros, nas coleções seguintes. É assim que muda a moda: em primeiro lugar por tateios e balões de ensaio, depois por sedimentações e amplificações “miméticas”, e no entanto particulares a cada vez; (Lipovetsky, 1987)
A moda dos Cem Anos, no geral, trata sobre a valorização dos ofícios da moda, sobre o aparecimentos de novas formas de gestão. A industrialização e fragmentação dos processos de produção descentralizaram a importância na figura do costureiro e do alfaiate, é quando inicia o Ready-to-Wear dos Estados Unidos ou Prêt-à-Porter. Isto é a fragmentação do processo de confecção das peças, de forma simplificada em: Tecido, corte, costura e acabamento. Fruto do processo de industrialização. Era a fusão entre a indústria e a moda, colocar a estética e a novidade na rua.
Pouco a pouco a indústria do Prêt-à-Porter entende a necessidade de se associar a estilistas para somar ao vestuário maior valor estético, aliada também à publicidade para alcançar maior público através da sedução na mensagem. Até os anos 1950 essa associação ainda acontece de maneira lenta, pouco criativa com criações ou revoluções em trajes tradicionais e é essa transição que encerra a moda dos Cem Anos, dando início a Moda Aberta.
Moda Aberta
As inovações mais marcantes no universo da moda inicia na segunda onda de estilistas por volta de 1960 e 1970 com nomes como Kenzo, que dinamizou a moda no começo dos anos 70 com cortes lisos derivados dos quimonos, com sua forte relação com as flores e a união entre Oriente e Ocidente; Thierry Mugler que apresenta o arquétipo feminino de cinema e sci-fi com bustos metálicos. Claude Montana com trajes com volumes ie larguras nos ombros; Jean Paul Gaultier com o enfant terrible manipulando o humor, derrisão, além da mistura dos gêneros e das épocas. Além destes nomes, Issey Miyake e Rei Kawakubo provocam ao propor novas proporções e formas para as silhuetas tradicionais orientais, que se unem aos traços e tecidos ocidentais. Estes são chamados de “Criadores de Moda”.
A oposição luxo/reprodução industrial de massa já não se faz sentido para essa análise como antagonistas, visto que estes sistemas agora possuem funcionamento em dependência e que a moda de massa não pode mais ser assimilada a uma cópia vulgar dos protótipos mais cotados da Alta Costura.
A indústria do prêt-à-porter não conseguiu fazer da moda um sistema radicalmente democrático já que ele próprio é fragilmente sustentado pela ascensão democrática das aspirações coletivas à moda. Evidentemente, esse movimento não pode ser separado dos progressos da indústria têxtil quanto às técnicas de fabricação do vestuário, progressos que permitiram produzir artigos em grande escala, de qualidade, a um baixo custo.
Após a Segunda Guerra Mundial, o desejo de moda cresceu e tornou-se um fenômeno geral em todas as camadas da sociedade. Essa democratização dos gostos de moda é fruto dos ideais individualistas, pela multiplicação das revistas femininas, do cinema, mas também pela vontade de viver no presente estimulada pela cultura de massa e da cultura do bem-estar, do lazer e da felicidade que acarretaram a última etapa da legitimação e da democratização das paixões de moda.
O prêt-à-porter coincide com a emergência de uma sociedade cada vez mais voltada para o presente, excitada pelo Novo e pelo consumo. A Alta Costura já não é mais fonte dominadora na criação das tendência, já que a juventude é o público em voga como cita Yves Saint-Laurent “Antigamente, uma filha queria parecer-se com sua mãe. Atualmente é o contrário que acontece”, e assim um novo público passa a dominar o mercado.
É nesse momento que acontece maior integração a arte moderna e um movimento de popularização desta, inclusive pela moda. Desde a democratização dos jeans, dos puídos e os tênis gastos do Grunge, os grafismos comics nas T-Shirts do movimento Geek, as estampas psicodélicas do movimento hippie, o couro e xadrez do Rock e do Punk. Um novo princípio de imitação social se impôs, o do modelo jovem. Até mesmo os mais velhos se engajaram em ao sportwear, às T-Shirts engraçadas, aos jeans, aos tênis de cano alto. Estilos que nasceram de forma anarquizada diante do sistema da moda, como contra-cultura, como movimento comportamental, mas que por ser parte de uma grande parcela da população, e parcela de público potente, tanto em ação política quanto econômica, foi sistematizada e transformada em produto atraente ao gosto geral. Com a promoção do estilo jovem o mimetismo se democratizou o que finalmente subverteu o modelo aristocrático que comandava desde sempre. O foco da imitação social era fruto da era moderna democrático-individualista, em que cada um trabalha em sua imagem pessoal a fim de se adaptar, manter, reciclar, e principalmente, pertencer.
O fim da moda dos Cem Anos se dá pela queda da hegemonia da Alta Costura. O que favorece a moda Aberta para expressar suas pluralidades principalmente pelos Criadores citados no início, inspirados pelo comportamento da vida social: Courrèges pelo modernismo, Alaïa pelo sexy, Chanel pelas experimentações nos comprimentos ajustados ao corpo, Mugler e a vampe hollywoodiana, a mulher monumental de Montana, o refinamento de Yves Saint-Laurent e Lagerfeld, as misturas irônicas de estilos de Gaultier, o look japonês ressignificado de Miyake e Yamamoto e as cores vivas e exóticas de Kenzo. Nada mais é proibido, tudo pode e é experimentado, todos os estilos têm direito de cidadania e se expandem. Não há uma moda única, há “modas”.
Enquanto a moda dos Cem anos preocupava-se em acentuar os gêneros de forma extremamente oposta, a moda Aberta vê na moda masculina potencial de criação e é depois de um longo momento de exclusão sob o signo da sobriedade, do preto e do compassado que o homem volta à moda. O vestuário masculino dá um passo em direção à moda feminina mergulhando no universo das cores vibrantes, experimentações de formas e grafismo, em que o divertido, infantil já não é proibido aos homens.
Não há mais protocolos ou exigências, os homens passam a utilizar-se dos cabelos compridos, enquanto mulheres se utilizam dos trajes sociais, antes tradicionais aos homens. Surge então um movimento de redução enfática entre o masculino e o feminino, movimento de natureza democrática. Mas o processo de equidade entre o vestuário não prossegue até sua anulação, o autor coloca que é utópico imaginar magazines de roupas unissex, e mesmo que na atualidade elas existam, ainda compõem um número mínimo diante da totalidade da indústria da moda. Este processo é frequentemente pressionado pela mídia e pela publicidade visto que frequentemente reafirmam a imagem sexy, feminina, magra, fruto da pressão estética, que perpetua esses espaços que distanciam a moda masculina e a feminina.
Paralelo à disseminação das referências de aparência se encontram os gostos gerais. O furor da minissaia nos anos 60 foi um passo importante para a autonomia feminina, mas o modelito, clássico entre garotas de quinze e vinte anos, não era popular entre as mulheres de trinta, visto que na opinião geral era um traje que as desfavorecia. Os ombros largos de Mugler e Montana foram poucos repetidos na rua, as superposições dos criadores japoneses também foi pouco sucesso de imediato. O fato é que os ombros amplos apareceram somente dez anos após os desfiles, da mesma forma com os outros estilistas.
O que caracteriza a moda aberta é essa autonomização do público, que não cede mais a imposição dos modelos e que decide, mesmo que num gosto geral, o que quer vestir, criando um movimento de tendências em que o estilista deixa de propor uma ideia do gosto pessoal e passa a estudar o público que atende.
Essa relação entre público e estilista criou a era da pequena velocidade de moda, em que o que “está na moda” e “fora de moda” se transforma muito rápido e suas fronteiras passam a se confundir e sua percepção social é mais vaga. E as coleções, anteriormente sazonais acabam por diminuir seu tempo de “troca”.
Com a moda aberta e o processo de redução da consideração social consagrado ao vestuário, começa um novo regime da imitação de moda. Durante séculos, a difusão de moda foi essencialmente feita a partir da corte e da aristocracia, as camadas inferiores copiavam invariavelmente as maneiras e as toaletes das classes superiores;(...)A moda de cem anos não infringiu de modo algum essa lei, sendo os modelos de imitação aqueles lançados pela Alta Costura e pelas mulheres da alta sociedade. Mas o que se passa hoje, quando o descontraído e o esporte estão na moda, quando até as estrelas se vestem como “todo mundo”? Operou-se uma mudança que destrói radicalmente a lei secular do contágio imitativo: já não se imita o superior, imita-se o que se vê em torno de si, os trajes simples e divertidos, os modelos não caros apresentados cada vez mais nas revistas. A lei vertical da imitação foi substituída por uma imitação horizontal, de acordo com uma sociedade de indivíduos reconhecidamente iguais. (Lipovetsky, 1987)
Desde seu início a moda une conformismo e individualismo, a diferença entre a moda Aberta e a Moda Consumada é que a mais recente se faz globalmente menos competitiva, até pela monopolização das empresas, menos preocupado com o olhar do outro, os excêntrismos são minoria. Porque tudo é permitido, mas publicamente há discrição, pouca originalidade. As loucuras dos criadores acabam por expressar um desejo que não resiste ao cotidiano e conflitam com a monotonia da rotina. E é nesta relação que existe a dúvida do porquê o que é apresentado em semanas de moda, como “Conceitual” não é visto nas ruas como “ Comercial” abrindo cada vez mais abismos entre o excêntrico e o ordinário.
Nessa lógica, os individualismos são menores que nos séculos anteriores em que a busca da diferenciação social e pessoal era febril. Em contrapartida dizer que o individualismo no vestuário e a autonomização comprova que as pessoas na atualidade se vestem para si, em função dos próprios gostos do que em função de uma norma imperativa. Porém o individualismo da moda Consumada, a ser explicitada a seguir, é menos glorioso, mas mais livres, menos decorativo e mais opcional, menos ostensivo e mais combinatório. Não é mais sobre parecer, aos olhos dos outros, único, mas sentir-se assim.
Moda Consumada
Em tempos de explosão de mídias, publicidade e lazer de massa a Moda Consumada se define por três características: o efêmero, a sedução e a diferenciação marginal. Diferente dos processos anteriores, o luxo já não serve como guia, mas esse processo tripolar que redesenha a sociedade.
Uma nova geração se instala de modo frívolo. Não há mais imposição coercitiva, mas socialização pela escolha e imagem; Não há mais Revolução, mas paixonite. Não há mais ideologia mas comunicação publicitária. Não há mais rigorismo, mas sedução do consumo e psicologismo.
A lógica econômica varreu o ideal de permanência, é o efêmero que impera, a temporalidade da moda fagocitou o universo da mercadoria e é a obsolescência programada que gerencia o consumo, propício a revigorar sempre mais consumo, sempre através de novos designs, novas propostas, novidades lançadas pela publicidades que nem sempre se utilizam de novos recursos essenciais para o produto, mas seduz o consumidor a desejar o novo produto, independente do “novo” que ele ofereça. Porque o novo é superior ao antigo, e a moda não oferece margem para ficar de “fora”.
A partir dos resultados da publicidade, é possível observar o público consumidor e entender seu consumo. Diante disso, o criador, anteriormente chamado de estilista, agora toma figura de “designer” que diante da lógica industrial, no contexto do pós-modernismo, projeta o produto para um público alvo, que o seduza sempre a compra a última versão. Esse design nasce como reação ao modernismo racional e austero herdado da Bauhaus são improváveis, provocadores e quase inutilizáveis. E esse processo se compreende não somente no universo dos objetos.
Essa ruptura pelo design e pela Bauhaus pode ser colocada em paralelo com a realizada pela Alta Costura: o design e a moda moderna. Recusando a ornamentação gratuita e por vezes reduzindo até suas funcionalidades, como o tradicional caso das calças femininas sem bolsos, redefinindo objetos em termos de ornamentos combinatórios e funcionais. A Alta Costura permaneceu fiel à tradição do luxo, da gratuidade do trabalho artesanal, enquanto a Bauhaus se atribuiu a tarefa de ser útil. Mas juntas contribuíram para revolucionar e desnacionalizar os estilos, para promover o cosmopolitismo das formas, fruto também do Capitalismo Multinacional.
Jamais se compreenderá a instalação permanente da moda consumada em nossas sociedades sem devolver aos valores culturais o papel que lhes cabe e que tanto o marxismo como o sociologismo não cessaram de ocultar. Não há economia frívola sem a ação sinérgica dessas finalidades culturais maiores que são o conforto, a qualidade estética, a escolha individual, a novidade. (...) Como não insistir sobretudo naquilo que, no império da moda, cabe ao poder cultural do Novo? A concorrência das classes é pouca coisa comparada aos efeitos dessa significação social que impulsiona, por si mesma, o gosto pelo diferente, que precipita o tédio do repetitivo, fazendo amar e desejar quase a priori aquilo que muda. A obsolescência “dirigida” dos produtos industriais não é o simples resultado da tecnoestrutura capitalista, tendo-se, antes, enxertado numa sociedade em grande parte entregue aos arrepios incomparáveis do novo. Na raiz da demanda de moda há cada vez menos o imperativo de demarcar-se socialmente e cada vez mais a sede do Novo. (Lipovetsky, 1987)
A moda Consumada, da mesma forma que a Idade Média é fundada pelo impulso da significação social, isto é, um status que tiveram seus significados na aristocracia, na Burguesia e hoje também vigora em todas as categorias sociais. E é nesse aspecto que a diferenciação marginal, um dos aspectos que fundamentam a Moda Consumada, se esclarece. Principalmente no contexto atual, em que os abismos sociais se tornam cada vez maiores e que grupos sociais menos abastados, periféricos e de cor tem “cara”, por vestirem códigos que, sob a ótica da obsolescência] e da efemeridade, são ultrapassados.
O código do Novo nas sociedades contemporâneas é particularmente inseparável da reivindicação individualista. Quanto mais os indivíduos se mantém à parte e são absorvidos por si próprios, mais gostos e aberturas à novidades. A questão neste processo é o poder aquisitivo, cada processo de descoberta gera um upgrade no próprio modo de vestir, o que significa um novo vestir, Uma metamorfose de si, ao mudar a própria pele, a roupa que é uma extensão de si. Porém os processos mesmo que acessíveis se mantém fiéis ao mercado, o que gera disparidade entre as classes sociais. Enquanto as elites garantem seu novo a cada troca de coleção, as classes menos abastadas reagem de forma mais lenta ao novo oferecido.
Em outras palavras a Moda Consumada é Elitista e exclusiva. Já que a ostentação, assim como em outros processos também citados aqui se torna uma instituição social. Um fenômeno recente fruto desta afirmação é o movimento Hype. Com marcas tradicionais, que fizeram seus nomes ainda no início das Maisons, como Balenciaga, Louis Vuitton e Gucci, que é o motivo para toda essa série de textos, mas que veremos mais a fundo na próxima parte.










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